segunda-feira, 9 de maio de 2022

“Faustão na Band” viola a marca registrada “Domingão do Faustão” da Rede Globo?

 


Depois de mais de 30 anos na grade da programação de domingos da TV Globo, o programa “Domingão do Faustão” chegou ao fim da era sob o comando de Fausto Silva. Em meio a muita polêmica sobre o que teria acontecido para justificar um rompimento tão repentino e abrupto, surge a dúvida sobre um ponto técnico que pode ainda gerar muito pano para a manga: poderá a TV Globo impedir o uso do apelido “Faustão” na formação do nome do novo programa do apresentador na Rede Bandeirantes?

 Entenda o caso

O nome do programa “Domingão do Faustão” é uma marca registrada no INPI de titularidade da TV Globo. Como consequência direta desse registro, a TV Globo é a única exclusiva titular do direito de uso dessa marca para identificar programas de televisão no Brasil.

Um dos pontos a se considerar é que a Lei da Propriedade Industrial veda a chamada reprodução parcial de marca alheia, de modo que qualquer outra marca e, para sermos mais claros, qualquer outro programa de televisão que usasse o nome “Faustão” poderia ser considerado como reprodução parcial da marca da TV Globo, caracterizando, assim, violação da propriedade intelectual da emissora.

Com base nesse raciocínio, qualquer utilização do nome “Faustão” que a Rede Bandeirantes quisesse utilizar em sua grade de programação para nomear o novo programa do apresentador poderia ser encarada como violação de marca registrada.

 A situação, porém, não é tão simples

Contudo, meus amigos, a situação não é tão simples assim.

A grande peculiaridade do caso é o que o nome “Faustão” não é um termo qualquer, mas sim um apelido usado como nome artístico, sendo, ainda, conhecido em todo o Brasil. Nesse tipo de situação, o regramento jurídico que é aplicado não é apenas aquele que dispõe sobre os direitos de propriedade intelectual, mas também os chamados direitos da personalidade, que dão uma maior atenção para a individualidade da pessoa.

A própria Lei da Propriedade Industrial veda o registro de marca que represente pseudônimo ou apelido notoriamente conhecidos, salvo com consentimento expresso do seu titular.

Foi exatamente o que aconteceu no caso da marca “DOMINGÃO DO FAUSTÃO”, da TV Globo.

Embora tenha tentado o registro da marca por diversas vezes, desde 1989, somente neste ano de 2021 é que a emissora conseguiu o registro da marca “Domingão do Faustão” por conta própria, a partir de uma autorização de uso do nome concedida pelo apresentador no ano de 2019.

Esse pedido de registro mais recente foi iniciado no ano de 2017 e foi indeferido pelo INPI em razão de a TV Globo não ter apresentado o documento de autorização de uso do nome assinado pelo apresentador, mesmo diante de exigência formulada pelo Instituto. Somente a partir da apresentação de um recurso acompanhado da autorização concedida é que a emissora conseguiu o registro da marca, em despacho publicado em 25/05/2021.

Com a concessão do registro, a expressão “Domingão do Faustão” passou a ser marca registrada da TV Globo, com validade até 2031.

 Sendo assim, poderia então a TV Globo impedir o uso do apelido “Faustão” pela Rede Bandeirantes?

Por mais polêmico que seja, entendemos que não.

A TV Globo não poderia impedir o uso do nome “Faustão” pelo simples fato de que esse é o apelido/pseudônimo do apresentador Fausto Silva e, de acordo com o Código Civil, os direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis (art. 11), não sendo juridicamente possível a um registro de marca ou até mesmo um contrato transferir a titularidade desse nome.

Por mais que a TV Globo seja, hoje, titular do registro da marca “Domingão do Faustão”, a emissora apenas conseguiu o registro em razão de autorização expressa do apresentador.

Uma vez que a própria lei diz que os direitos da personalidade são irrenunciáveis, não poderia ser considerada a “irrevogabilidade” dessa autorização. Em outras palavras, da mesma forma que a autorização foi concedida, ela pode ser retirada.

De igual modo, assim como o apresentador autorizou o uso de seu apelido pela TV Globo, também ele poderia autorizar o uso do nome pela Rede Bandeirantes.

Sendo assim, não poderia a TV Globo impedir o uso do nome “Faustão” pela Rede Bandeirantes para compor o novo nome do programa do apresentador (“Faustão na Band”).

 Poderia então a Rede Bandeirantes usar a marca “Domingão do Faustão”?

Aqui já é diferente. Apesar de poder utilizar o nome “Faustão” para compor o nome do novo programa “Faustão na Band”, utilizar o mesmo “Domingão do Faustão” poderia ser considerado abuso de direito e concorrência desleal, em razão do aproveitamento indevido de toda fama e notório conhecimento do programa.

Assim, pode a Band utilizar “Faustão na Band” ou qualquer outro nome que contenha o apelido do apresentador, mas sem reproduzir diretamente a marca da TV Globo.

 Conclusão

Por mais polêmica que seja a situação, a lei protege, em primeiro lugar, os direitos da personalidade da pessoa civil, sendo o nome ou simplesmente seu apelido, um direito intransmissível e irrenunciável de qualquer cidadão.

É sempre bom lembrar, no entanto, que aqui estamos falando apenas do que diz a legislação aplicável, com foco na Lei da Propriedade Industrial, sem considerar eventuais cláusulas contratuais a respeito do vínculo do apresentador com sua antiga emissora, que podem deixar a situação bem mais complexa.

E então, será que essa situação ainda vai dar muito pano para a manga? 

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